sexta-feira, 29 de abril de 2011

a vida é feita de muita caloria.
meu coraçao nao vê fronteiras, ele é cego pros lados, pros nortes, sobrenomes, pras noites, dos selos sô sente as cores, cego, mas em todos os corpos vê luzes, pra eles guarda amores, e crê, porque coraçao nao pensa, acredita logo de vez, que lugar qualquer é o lugar de viver.

sábado, 23 de abril de 2011

todos os alemães, sem nenhuma exceção, os ramsters, os macacos, os cachorros e os gatos que não fazem cocô no chão, todos entendem alemão, eu não.
nas ruas de berlin os homens andam com garrafas, os cachorros sem coleiras.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

mon amour, me diga o que eu não entendo, o que está para além da minha compreensão, da compressão, me fala mais, canta pra mim, me penetra com teu som estranho, com tua lírica entrecortada, sona teu sentido que me chega em fatias, geme, me embala nesse cântico de turbinas, me faz dormir, me chama, mein Mädchen, meine Liebe, mon amour, depois me chama, rediga tudo desde o princípio das eras, jusqu'à luz du jour, reza tua língua no meu mamilo pequeno, ora lá a tua oração bem baixinho, sopra quente e leve, quentinho, eu gozo com você essa religião, conversa com meu pescoço, meu corpo se desmancha na tua língua sem sotaque, ele fala contigo.
adoro berlin. as gargalhadas ecoam na estação. as crianças se penduram nas janelas dos ônibus. em resposta, as mães fazem cara de bexiga. os pais olham a paisagem. as meninas têm os cabelos vermelhos. as bicicletas, pintadas de cor-de-rosa. e as meninas andam de bicicleta. levam-nas dentro do ônibus e das estações, em meio às gargalhadas e às crianças e ao pais das crianças. as moças descomportadas se olham com delicadeza. não se pede pardon por qualquer encosto. as cabeças dxs jovens são suporte para esculturas imprevisíveis. hoje fez sol.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

quero teu florido

de árvore alemã

onde meu foco

vira garrancho

e canção.
o thiago de mello diz, no artigo sexto do "estatuto do homem", que a maior dor é não poder dar amor a quem se ama. e quando o amor é demais que ameaça estourar o peito da gente ? ele vem e nos dita a sentença: esta dor de fazer latejar ou explode coração. [pra parar de te machucar].
aprender o francês correto, falar sem sotaque, não andar de all star e sem meia sobre o gelo, não chocar a cultura local nem a dominante global, respeitar esta nação que me recolhe, ir bem na faculdade, mostrar todo o potencial do terceiro mundo em 10 páginas de espaçamento simples, times new roman ou o tempo dos gregos, dos novos latinos, dos novos baianos, mas não, sobretudo nunca falar em terceiro mundo, jamais expor o racismo a ser engolido, obedecer a regras cegamente, como se espera que se faça especialmente em seu próprio país, porém não esquecer de, antes de mais nada, esquecer o seu país, que nunca lhe pertenceu, e tratar logo de perder esse accent, d'effacer essa sonoridade étrange et étrangère do seu vocabulário e, à propos, escrever um novo dicionário com estas páginas em branco da sua cabeça, sempre vazia e tão cheia de idéias inoportunas, ne plus rappeler ce qui tu croyas que tu étais, tout oublier, bien parler, bien vivre, bref, bien-être ailleurs, voilà. das ist alles.
“Meu pai me inicia na infância. Ele me cria como um menino. Seu orgulho. A graça de uma menina. A agilidade de um menino. Eu tenho sua vontade, ele diz. Ele me ensina o fute, o vôlei, o crawl. Ele me ensina a mergulhar nos rochedos morenos e brilhantes. Como os bandidos.
Ele transmite sua força. Ele me ensina a me defender no país dos homens. Correr. Saltar. Se salvar. Ele desvia minha fragilidade. Ele me chama de Brio. Eu ainda ignoro por que. Eu amo este prenome. (...) Os homens da praça de Hydra. Suas mãos nos meus cabelos. O filho ou a filha de Rachid?
(...)
Uma mulher sobe a falésia. Ela não é argelina. Ela não é francesa. É uma boa nadadora, dizem. Ela não mergulha, ela dá. Seu corpo. Sua impulsão. Sua flexão. Seus ombros fortes. Paola. Seu filho chama. Pelo seu nome. Paola. Seu marido que procura. Ela retorna, rápido. Encostada no muro. Um animal. Ela espera sua vez. Ela está perto de mim. Ela diz. Você é bonito. Eu não respondo. Eu mergulho. Eu escondo meu rosto. Eu mergulho. Com vergonha. Eu não subo de volta. Eu detesto o mar. Eu desteto os mergulhadores. Eu detesto a França. Eu detesto a Argélia. Você é bonito. Amine desmente. Amine me protege. É Nina. É uma menina. Amine se defende. Ela não amaria assim um menino. Ele ama esta menina. Esta falsa menina. É a sua loucura. Para este macaco. Para este travesti. Paola. Você é ainda mais bela se você é uma menina. Eu não respondo. Eu não sei. Eu não me sei.
Paola. Suas pernas. Seu cigarro. Seus lábios que fumam. Sua voz que pronuncia. Paola. Seu ventre. Sua pele. Ela fica sobre o rochedo. Ela me olha. É uma adoção. Sua voz e seus mergulhos. Suas mãos nodosas. Mãos de mulher. Sua fumaça no meu rosto. Este cheiro com o cheiro do sal. Minha vergonha é um silêncio infinito. Minha vergonha fecha minha vida.
O mar toma tudo. Eu o olho. Com todas as minhas forças. O mar se retira. Eu o retenho só pelo meu corpo, que não se vira jamais completamente sobre o corpo de Paola. Eu fico em equilíbrio. Eu fico em desequilíbrio. Paola. Eu rezo a noite. Eu rezo o céu. Eu rezo Amine. Paola. Por muito tempo eu escutarei sua voz.
(...)
Você tem os cabelos longos, negros e afivelados. Você chora por nada. Você geme. Você é chamado de fonte. Você tem crises de nervos. Eu te subo à cabeça. Tua pele é tão branca, tão fina. Você envelhece sob a pele de uma menina. Eu te ensino as forças do corpo. Eu te amo como um homem. Te amo como se você fosse uma menina. Você funda a mentira de toda minha vida. O mundo inteiro se confunde em mim. Sou eu que é preciso salvar de você, Amine. Sou eu que estou em perigo. É de mim que é preciso cuidar, sou eu a ser curada. Tomada em conta»
(Nina BOURAOUI, Garçon manqué, p. 24; 36; 62, l. tr.).