domingo, 13 de junho de 2010

"Há muito tempo queria trabalhar com Marco Antônio Braz. QUando lemos A ALMA BOA DE SETSUAN me impressionei com a atualidade e o humor do texto. Quando ele me disse que gostaria de encenar a peça porque acha que Brecht é divertido, me entusiasmei. Também acho. Brecht é divertido e tem a sabedoria de, através de uma história bem contada, dizer o que quer, questionando o caos social, no qual, inacreditavelmente, nos acostumamos a viver.
Quando Chen Tê é escolhida como a única alma boa achada pelos deuses cansados de procurar, ela mesmo duvida disso: "Como posso ser boa se tenho que pagar o aluguel?". Gosto dessa frase, gosto deste assunto. Quero viver Chen Tê para, junto com vocês, tentar decifrar o enigma deste mundo em que vivemos, onde o indivíduo parece ser incompatível com o todo. Onde já não basta ser bom, digno e coerente com o que se acredita. Onde tudo leva ao pensamento individual, cada um lutando desesperadamente pelo seu quinhão. Chen Tê traveste-se de 'seu primo' para conseguir dizer não, para conseguir não ser boa, para não ser usurpada. Será que vivemos a impossibilidade da bondade? Será que a existência de uma sociedade solidária é impraticável no meio de tamanha diferença social? Será que estamos condenados cada vez mais a não nos comprometermos? Aos fones de ouvido, aos e-mails rápidos, aos motoristas solitários indo para o mesmo lugar que seu vizinho de congestionamento, às cabeças baixas, medrosas de testemunhar algum crime?
Na verdade, não acho que a peça trate exatamente da impossibilidade da bondade, pois a própria palavra bondade já foi transfigurada pelos tempos que vivemos. Falar hoje que alguém é bom é quase falar que esse alguém é bobo. Acho que a peça fala claramente é da impossibilidade da disponibilidade, do coração aberto, da esperança. Mais que boa, Chen Tê é disponível. Acredita na possibilidade de vivermos em harmonia. É muito importante falarmos do cuidado que precisamos ter com o que estamos nos tornando, vivendo num mundo onde não dou mais a mão com medo que me tomem o braço, ignorando que, muitas vezes, só minha mão estendida moveria montanhas. Estamos falando de comprometimento, de sinal de alerta, estamos questionando por que precisa ser assim. Deve haver uma saída. Tem de haver! Tenho necessidade absoluta de contar esta história e estou muito feliz de estar ao lado de gente que admiro tanto para esta empreitada" Denise Fraga, Alma Boa de Setsuan, de Bertolt Brecht (em cartaz até 1º de julho de 2010, temporada popular).

Um comentário:

Guiga disse...

pois é fernanda nada mais atual que isso eu acho. ser tem algo que está acontecendo é um isolamento do ser humano no interior de si mesmo.